"Quando a gente gosta da Física, as coisas ficam mais claras!"
A física brasileira perdeu na última sexta-feira um de seus maiores empreendedores. Na noite do dia 30 de dezembro faleceu o Professor Paulo Leal Ferreira, fundador do Instituto de Física Teórica.
Desde segunda-feira tenho enrolado para escrever este post, pois sempre fico deprimido quando penso nessa perda. Para a maioria dos atuais estudantes do IFT o Prof. Paulo é apenas uma figura de exemplo pela sua iniciativa e coragem de fundar uma instituição de pesquisa, independente de qualquer iniciativa pública. Porém, para aqueles que tiveram o privilégio de conviver com ele pelos corredores do Instituto, ele era acima de tudo um daqueles apaixonados que se divertia com equações e longas discussões sobre os vários ramos da física. Lembro-me de um dia estar sentado em frente à mesa do café, próximo ao auditório menor (que leva o nome do irmão do Paulo, Prof. Jorge Leal Ferreira) extremamente compenetrado, tentando provar de maneira explícita a invariância dos parênteses de Poisson sob transformações canônicas (tarefa que meu orientador de Iniciação Científica tinha proposto). Eu devia estar com uma cara bem feia, e lembro que resmungava e xingava as equações nas folhas soltas sob o meu colo. Foi quando o Prof. Paulo passou (para olhar a estante de preprints, acho), virou p/ mim e disse: "O seu problema é que você não está se divertindo."
Eu disse: "O quê?"
"Você não está se divertindo, não gosta do que está fazendo, por isso não consegue enxergar a resposta." - ele repetiu. "O que é que você está fazendo?"
Eu expliquei, ao que ele me retorna: "Ah, mas isso é muito bonito!" E então começou a discorrer sobre as diversas aplicações e implicações da invariância que eu tentava provar, me fascinando com a sua paixão. Terminamos a nossa conversa, pois a minha reunião com o meu orientador já ia começar. Eu comecei a exposição daquele dia falando sobre transformações canônicas, e depois passei a enunciar e provar as propriedades dos parênteses de Poisson. Ao final o Bruto (meu orientador, Prof. Bruto Max Pimentel) me perguntou: "E a invariância, você provou?" Aí então eu lembrei da última frase do Paulo, antes de eu entrar no auditório: "Você tem que gostar da Física. Quando a gente gosta da física as coisas ficam mais ... claras!"
Respondi então ao meu orientador: "Não, não provei, mas agora eu sei provar!" - e acabei alongando a reunião por mais uma hora só para provar a invariância de três modos diferentes, tamanho o gosto que tinha pego por aquilo.
Eu disse: "O quê?"
"Você não está se divertindo, não gosta do que está fazendo, por isso não consegue enxergar a resposta." - ele repetiu. "O que é que você está fazendo?"
Eu expliquei, ao que ele me retorna: "Ah, mas isso é muito bonito!" E então começou a discorrer sobre as diversas aplicações e implicações da invariância que eu tentava provar, me fascinando com a sua paixão. Terminamos a nossa conversa, pois a minha reunião com o meu orientador já ia começar. Eu comecei a exposição daquele dia falando sobre transformações canônicas, e depois passei a enunciar e provar as propriedades dos parênteses de Poisson. Ao final o Bruto (meu orientador, Prof. Bruto Max Pimentel) me perguntou: "E a invariância, você provou?" Aí então eu lembrei da última frase do Paulo, antes de eu entrar no auditório: "Você tem que gostar da Física. Quando a gente gosta da física as coisas ficam mais ... claras!"
Respondi então ao meu orientador: "Não, não provei, mas agora eu sei provar!" - e acabei alongando a reunião por mais uma hora só para provar a invariância de três modos diferentes, tamanho o gosto que tinha pego por aquilo.
O Prof. Paulo é homenageado pelos estudantes do IFT com a realização anual de um Congresso que leva o seu nome, e que na sua 28º edição em 2005 comemorou os 80 anos do Prof. Paulo. No ano 2000 a comissão organizadora do Congresso Paulo Leal Ferreira produziu um vídeo que conta um pouco da história do Congresso e do IFT através de uma entrevista feita com o Prof. Paulo. Esse vídeo pode ser baixado clicando-se no título deste post ou também aqui. Recentemente alguns professores do Instituto também preparavam uma documentação para indicar o nome do Prof. Paulo ao Prêmio Fundação Conrad Wessel de 2006, mas a sua trajetória foi muito bem ilustrada por um artigo no Jornal da Ciência.
Uma missa em sua memória será celebrada nesse domingo 08 de janeiro, às 10:00, no Mosteiro São Bento.
3 Comments:
Belo post, Cassius! Você realmente teve sorte de conhecer um físico assim, de entusiasmo contagiante.
Pioneiros como ele são, mais do que nunca, exemplos a serem difundidos.
Como as posições em institutos tradicionais estão escassas, boa parte dos jovens doutores em Física terá que trabalhar em lugares sem estrutura pronta, começando praticamente do zero, (re)inventando tudo. O espírito empreendedor do professor Paulo Leal Ferreira e o sucesso de seu empreendimento (o IFT) são exemplos que estimulam nossa geração a mergulhar com esperanças renovadas nessa nova fase da Física brasileira.
Excelente comentario, Andre. Eu fui aluno do IFT, entre 96-02, e agora estou numa universidade pequena. O exemplo dos fisicos antigos (dos grandes Fisicos como o Prof.Paulo) que comecaram do zero mesmo é um incentivo pra nos continuarmos lutando, e nao termos medo de enfrentar os problemas dos centros pequenos.
Alexandre G. de M. Schmidt
oiiiiiiiiiiii...
esse blog é maravilhoso e o assunto mais ainda...
crislaine
silva
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