13.12.05

Aprenda Física Brincando!




Estive um pouco afastado do blog estes tempos por conta de outros afazeres acadêmicos, mas agora as coisas começam a voltar à rotina normal.
Neste post quero destacar a atuação da Oficina de Educação através de Histórias em Quadrinhos (EDUHQ) que começou como um trabalho isolado do Prof. Francisco Caruso do CBPF e hoje agrega várias pessoas, entre pesquisadores, alunos e bolsistas. Com a permissão do professor Caruso, estaremos publicado aqui, sem uma periodicidade certa, algumas das tiras escritas e desenhadas pelo pessoal da oficina. Estas tiras vem no sentido de complementar o lado lúdico de nosso blog, ao lado de outros materiais de uso aberto, como as excelentes tiras do Calvin retiradas dos álbuns "O Progresso Científico de TILT".

8.12.05

Os mais importantes avanços da Física em 2005

por Andre

De acordo com o American Institute of Physics (AIP) a mais importante notícia do ano em Física foi o relatório conjunto dos quatro detectores do RHIC afirmando que o novo estado criado com a colisão de íons pesados não era um plasma (fracamente interagente) de quarks e glúons, como se dava como certo por vários anos, mas sim um líquido fortemente interagente dessas partículas.

Outras notícias destacadas do ano (ordem cronológica):

- the arrival of the Cassini spacecraft at Saturn and the successful landing of the Huygens probe on the moon Titan (link);

- the development of lasing in silicon (link);

- the biggest burst of light ever recorded from outside the solar system, from a soft gamma repeater (link);

- further evidence for superfluid behavior in a solid (link);

- detection of infrared radiation directly from an exoplanet (link);

- zeptogram mass sensitivity in a cantilever sensor (link);

- spashless impact of droplets at low pressures (link);

- the demonstration of pyrofusion, fusion reactions created with a pyroelectric crystal (link);

- the best yet prediction of hadron masses using lattice QCD (link);

- the best measurement yet of the weak nuclear force (link);

- superfluidity directly observed in a sample of ultracold fermi atoms (link);

- extension of the "comb" technique for measuring frequency (a topic pertaining to the 2005 Nobel prize in physics) into the ultraviolet (link);

- geoneutrinos observed (link);

- hybrid atom-molecule dark states (link);

- criação do Blog do IFT (link) ;-)

- using statistical mechanics to predict the effectiveness of flu vaccines ( link);

- hydrophobic water (link);

- 2005 Nobel Prize (link);

- molecules that walk (link);

- phonon Hall effect (link);

- short gamma ray bursts identified as coming from in-spiraling neutron stars (Nature 6 October);

- hyperentangled states (link);

- further progress in research concerning left-handed or negative-refraction materials, including perfect lensing (Science 22 April), almost perfect lensing in the mid-infrared (link);

- extension of negative-index behavior into the near-infrared region (link).

7.12.05

O homem frigideira


por Andre

Semana passada foram lançados dois livros baseados em notas de aulas que físicos célebres deram no CBPF na década de 50: Física Nuclear Teórica, de Richard Feynman, e Classical Statistical Mechanics, de Leon Rosenfeld. Mais uma iniciativa deste produtivo Ano Mundial da Física que já vai deixando saudades.

Anteontem encontrei o livro de Feynman numa livraria e dei uma folheada. Espalhamento em potenciais, decaimento alfa/beta, phase shifts, modelos de camadas, essas coisas imutáveis da Física Nuclear que provavelmente nem se ensina mais nas graduações. É um texto de interesse fundamentalmente histórico, claro: é destino das notas de aulas serem esquecidas quando o tema amadurece o suficiente para aparecerem livros-textos, de exposição muito mais elaborada. O livro do Rosenfeld eu não vi, mas, como o título me leva a crer, deve ter resistido melhor ao tempo.

Motivado pelo lançamento dessas notas de aulas, resolvi reler no meu Deve ser brincadeira, Sr Feynman o trecho em que ele fala de sua estadia no Brasil (você pode encontrar o texto on line). Foi em 1951 que ele passou um ano sabático aqui, colaborando no CBPF de Lattes e Leite Lopes, ministrando inúmeras aulas e seminários. Paralelamente aprendeu a tocar frigideira (isso mesmo, com uma colher) num bloco carnavalesco, paquerou aeromoças da PanAm, "introduziu" o português como língua oficial da Academia Brasileira de Ciências e mais outras coisas inusitadas que o tornaram famoso.

Já há bastante tempo percebi que alguns físicos mais velhos não se sentiam à vontade quando os mais jovens falavam sobre a visita de Feynman ao Brasil. Claro, não sei de nenhuma fofoca mais escabrosa, mas atribuo esse comportamento ao que acabou aparecendo naquele pequeno relato. Lá Feynman frequentemente faz alusões ao jeitinho ("astúcia") brasileiro. Por exemplo, lhe foi sugerido que fizesse suas aulas de manhã no CBPF, pois de tarde a praia era melhor. "E os alunos?" Os alunos preferiam aula à tarde, mas Feynman deveria escolher o
que fosse mais conveniente para ele. Isso impressionou Feynman, como num choque de culturas. Então tá... :)

No seu relato ele tambem faz várias alusões à estranha formação brasileira da época (?) que valorizava sobremaneira a erudição, ou seja, o conhecimento enciclopédico da Física, em detrimento da assimilação conceitual e aplicação prática. Fez inclusive um discurso marcante sobre isso na Faculdade Nacional de Filosofia. Aponta também uma característica que frequentemente estrangeiros observam: os estudantes brasileiros não fazem perguntas. Conheci mais de um físico americano impressionado com esse comportamento. Não sei de onde vem isso.

Assim, acho que espíritos mais sensíveis ficaram um pouco chateados com essa narrativa de Feynman sobre sua visita ao Brasil. Não deveriam ficar tão chocados. Se continuarmos lendo o livro saberemos o que Feynman fala sobre o Japão e a Suécia, por exemplo. De cada país ele sempre apresenta lados (pretensamente) negativos (japoneses muito formais ou a tradição das gueixas) e positivos (a busca nipônica da perfeição). Feynman não pode evitar em ser sincero. E sendo assim, sempre falará o que realmente achou das pessoas, tanto seus defeitos como suas virtudes. Faz parte do seu show.

Também acabei esbarrando (esse post já está ficando longo demais...) no capítulo em que fala de sua depressão em Cornell. Pois é, mesmo o furacão Feynman, a alegria de fazer Física em pessoa, o instigador de gerações, também teve sua maré baixa. Foi logo após o fim da Segunda Guerra: havia terminado sua tese de doutorado (a integral de caminho) e participado do projeto Manhatan (construção da bomba atômica); na mesma época sua esposa falece após longa doença e, pouco tempo depois, perde seu querido e influente pai. Feynman estava em Cornell dando aulas e conseguia fazer apenas isso. Ficava muito culpado por não estar produzindo pesquisa, mas não podia escrever duas frases sobre raios gama sem se desanimar. Achava que estava acabado para a Física, isso um ano antes de atacar o problema da renormalização que lhe rendeu o Nobel. Chegou mesmo a pensar em pedir demissão. Mas Robert Wilson, futuro Prêmio Nobel também, que era seu superior, percebendo o baixo astral de Feynman e a consequente crise de culpa, lhe esclareceu que contratar um professor é uma aposta, com riscos implícitos, e que naquele momento estavam muito satisfeitos com o trabalho que Feynman estava realizando (ou seja, apenas dar aulas). Isso reconfortou Feynman e em alguns meses voltou a ser uma usina de idéias.

Duas lições. A primeira: ciência é uma aposta de longo prazo. A segunda: mesmo Feynmans tiveram seus períodos de crise profissional. Isso pode ser reconfortante.

Por fim, um livro em português que conta muitas das anedotas de Feynman (e seu rival Gell-Mann) é o Feynman e Gell-Mann. Luz, Quarks, Ação, do professor Rogério Rosenfeld, aqui do IFT. Vale a pena dar uma olhada.

2.12.05

Francis e Letterman

Como informado, aconteceu ontem aqui no IFT uma instância do Beyond Einstein. Foi projetada no telão do auditório maior a imagem do webevento e o pessoal pôde conferir as atrações anunciadas. Consegui ver um pedaço da entrevista com o pessoal de Solvay e todo o Late Show with Leon Lederman.

Até onde vi, Gell-Mann dominou totalmente a cena em Solvay. Isso que estavam a seu lado nada menos que David Gross e Gerard 't Hooft. A primeira pergunta foi sobre o que mudou no panorama da Física desde a última conferência que tratou da estrutura quântica do espaço-tempo. Alguém precisava assumir a pergunta e logo Gell-Mann se manifestou. Mas não era possível entender nada do que ele dizia (até pensei que era problema local, pois nossa banda é pequena e às vezes dava umas "tossidinhas" :) ). Depois de um minuto de explicações inaudíveis a apresentadora tomou coragem e pediu que ele se aproximasse mais do microfone. Então se ouve claramente: "WHERE IS THE MICROFONE?!?!"; após alguém apontar um objeto na mesa, mais uma trovoada de Gell-Mann: "THAT'S THE MICROFONE?!?!?!" Que início! :)) Em seguida veio a segunda pergunta, muito interessante, sobre o que teria vindo antes do Big Bang e em que bases se pode afirmar qualquer coisa sobre isso. Novamente Gell-Mann assume a pergunta para si e diz "You should have asked what happens when t squared is less than zero" (quem perguntou era um high-school student...). Então 't Hooft interferiu expressando, muito sensatamente, que no atual estágio de desenvolvimento só pode haver especulações sobre isso e falou sobre o tempo euclidiano de Hawking. Entra a voz de Gell-Mann:"BUT THAT´S WHAT I WAS TALKING ABOUT!!". E foi indo assim. Infelizmente tive que sair, verei se consigo achar o vídeo on line. Como disse um amigo do IFT, o Gell-Mann é uma espécie de Paulo Francis da Física :)

Às 18 horas começou o Late Show with Leon Lederman, uma paródia do talk-show de David Letterman. Lederman, prêmio Nobel em Física de 1988 (pela descoberta do neutrino do múon e verificação da estrutura dubleto dos léptons), apareceu com a gravata mais colorida de que já se teve notícia. Na abertura, enquanto enumerava os artigos do Annus Mirabilis, contou algumas piadas ao estilo Letterman: "realmente foi incrível que um examinador de patentes, trabalhando 8 horas por dias, sete dia por semana tivesse tempo e concentração para fazer tudo isso. Aliás, parece que uma das patentes que ele aprovou foi a da lanterna movida a bateria solar!" :)). Entrevistou três convidados: um físico teórico (sobre os quais Lederman, um experimental, frequentemente fazia piadas) e dois experimentais, uma do D0 e outro do CDF. Muito bem bolado, com este formato conseguiram fazer um excelente panorama do Fermilab. Um amigo disse que gravou o show, se eu conseguir o arquivo eu disponibilizo por aqui.

Não se pode deixar de mencionar as Cernetes, três belas cantoras/dançarinas que interpretavam a música Strong Interactions, uma espécie de jingle do Beyond Einstein. Percebi mais do que uma física escandalizada com essa performance :-)

Gostei da webexperiência.


Nota: Este provavelmente é meu último post como membro oficial do IFT. Segunda-feira termina meu segundo ano de pós-doc aqui e preciso seguir minhas andanças em busca de uma posição permanente. Pretendo, pelo menos por um tempo, ainda continuar participando do blog, através do envio de posts. Meus votos para que o Blog do IFT continue em sua trajetória de sucesso!